24.10.16

Noite, devagar.

"Lenta como as árvores,  o vinho, alguns rios, o amor - assim a noite deve ser -" dizias-me um dia no comboio, debruçada à janela. Estávamos na Alsácia? Na Borgonha? Na Toscânia? Não sei qual o rio para o qual olhavas quando me dizias "a noite deve ser lenta porque é na lentidão que a verdade nasce". "Na ou da? perguntei. "Na da... que importa?" É  assim: "       " e dançaste uma árvore. Mostraste-me como dançam as árvores e com quem: um rio, um comboio, uma voz, se for lenta. Um olhar.

"Devagar como as árvores dançam".

É assim que me lembro de ti: como dançam as árvores. Lentamente, folha a folha, ramo a ramo, vogal a vogal, passo a passo, poro a poro.

(Na casca um canivete cruel lembra-nos outros rios, outros tempos.)

O vento. Um rio caudaloso. A areia na pele, a cascata no olhar. A mão que lentamente afaga; a mão; a pele. Isto é: arvores, mãos e olhos à flor da pele. Um rio caudaloso é lento se lento for o olhar que o olha.

A lentidão é uma árvore cujas raízes embalam o mundo. Devagar, como o desejo e o olhar se misturam antes de dormir.

É noite, lentamente. É verdade. 

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