4.12.11

Diário de bordos - 041211

Mais um ciclo que acaba: uma ida relâmpago a St. Martin, e hoje mini-regata daquelas "largamos daqui a 5 minutos, ok?".

É preciso desconfiar das primeiras impressões. Ontem gostei de St. Martin (por causa de St. Martin, não da empregada brasileira do bar onde tive esta revelação). Foi um dia cansativo: chegámos às quatro da manhã; às oito estava no escritório da marina. Clearance, duches, pequeno-almoço - cheguei ao ship chandler às dez e saí de lá às 5 da tarde, com um breve intervalo para o almoço e a dupla epifania: desconfiar das primeiras impressões e gostar de St. Martin.

Em português um ship chandler é uma loja de aprestos marítimos. Um marinheiro - qualquer marinheiro - fica feliz quando vê um bom ship chandler, tão feliz como uma dona de casa num hipermercado das coisas exóticas, raras, bonitas com as quais ela sonhou toda a sua vida. Foi lá que passei o dia, acompanhado por um vendedor chamado Rex a fazer compras para a empresa. A lista de items era maior do que a lista de desejos de uma adolescente, mas a Island Water World tinha praticamente tudo aquilo que dela constava.

Almocei ao balcão de um barzito de uma das marinas da laguna. A empregada era brasileira, a salada de polvo não sei de onde e também era óptima; ouvia falar francês, inglês e espanhol como se estivesse no centro de traduções de uma conferência internacional. Enfim, não vale a pena tentar perceber: estava enganado.

Da viagem pouco há a dizer: dezasseis horas à ida e aguaceiros, vento, frio, chuva a jorros à vinda.

Dias: zero ou um, com pouco no meio, quase nada.

Para fazer leme é preciso paz; quero dizer, estar em paz. Fazer leme é português recente. Quando comecei a falar dizia-se governar. Em inglês é to steer e em francês barrer. Gosto mais de governar. Para governar é preciso estar em paz.

Cheguei cansado. Quando fui fazer a clearance sentia-me um zombie; depois recuperei. É curioso como o cansaço muda: dantes não dormia três dias e de repente caía-me em cima como um martelo. Hoje não durmo dois e a fadiga vai-se acumulando numa caixa que de vez em quando se entreabre e deixa sair um bocadinho. Como puns, uns mais malcheirosos do que outros.

Dormi dez horas seguidas. Não foi bem dormir, foi uma espécie de pequena morte, um coma profundo, reparador: não acordei, ressuscitei.

De uma forma geral - há excepções, claro - as brasileiras são feias. E são prodigiosas a fazer-nos esquecê-lo.

Um dia vou deixar de gostar de navegar; mas não consigo imaginar como serão os dias depois desse. De que serão feitos, de que tristezas, cansaços? Não há melhor cansaço do que o do mar, nem tristezas mais irrelevantes.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.