10.2.11

Instruções

Alda era uma miúda pequena, magra, com um grande par de mamas . Uma combinação à qual eu, que sou gordo e grande (e quase velho: um homem de sessenta anos não é velho, hoje em dia), resisto mal. Tinha menos 20 (e poucos) anos do que eu; tentei várias vezes viver com ela, apesar de todos os dias acordar com vontade de lhe dar uma chapada (só não dava por causa dessa porcaria dos jornais, um homem na minha posição já não pode dar-se a certos luxos).

Não tinha cabeça nenhuma, a mulher; dizia-lhe as coisas vintes vezes e era como se estivesse calado. Ou pior ainda: como se lhe tivesse dito o contrário do que disse. Era de perder a cabeça, mas mesmo assim aguentei-a e dei-lhe de comer e dinheiro e roupa e um carro – tudo, dei-lhe tudo (enfim, com o prédio do Príncipe Real teve sorte, porque o malandro do notário – agora tenho a certeza de que também andava metido com ela; cada vez desconfio mais que me enganava com toda a gente – não conseguiu anular a doação a tempo. Disse ele; eu não acredito. Se não, agora veria o prédio por um canudo, essa é que é essa).

Foi num jantar que dei lá em casa. Estávamos a falar dos pratos favoritos de cada um. Isto pode parecer conversa trivial, conversa de chacha; mas, meus caros, quando os vossos convidados juntos representam mais de 1% do PIB português não há conversas de chacha.

Eu estava farto de dizer à Rita que gosto das batatas fritas grandes. “GRANDES, percebe?” - Tinha que lho gritar cada vez que combinávamos um menu que incluísse batatas fritas. E a porcaria das batatas (descupem, mas ainda estou fora de mim) lá vinha pouco maior do que batata-palha. “Rita, o peso mínimo para cada pedaço de batata crua é 40 gramas. Q-u-a-r-e-n-t-a g-r-a-m-a-s, percebe a menina?”

Ela dizia que sim com a cabeça, fazia-me uma festa no braço, olhava sugestivamente para um pouco abaixo da minha cintura – e pronto, eu parava de gritar e ela lá ia à sua vida.

Até ontem. O tema era, como disse, os pratos favoritos de cada um; quem começou a conversa foi o Bertrand (um francês dono de uma cadeia de pronto-a-vestir): falou em foie gras, e essas coisas que são de esperar da parte de um francês. Até que chegou a vez do Ramiro: “eu vou surpreender-vos; o meu prato favorito é...” fez a pausa da praxe, “batatas fritas. Mas grandes, batatas fritas grandes. Venderia a boa metade da minha familia, se não estivesse já vendida” (piscou o olho à assistência. Pareceu-me que... Enfim, não interessa) “por um bom prato de batatas fritas grandes”.

Eu fiquei mortificado, como podem imaginar. E logo o Ramiro, a pessoa que eu queria interessar para uma ideia de negócio que tive há uns tempos e que me parece uma oportunidade única (uma escola de sopradores de vidro, se quiserem saber). Tentei balbuciar qualquer coisa, “Ó Ramiro, eu também … eu … desculpe... “ mas as palavras entaramelavam-se-me todas. Até que lá consegui dizer “Vê, Rita, quantas vezes lhe tenho dito que as batatas fritas devem ser grandes?”

E foi aí que aquela estúpida se volta para mim com uma frieza extraordinária, um sorriso lindo na cara, e responde “António Francisco, estou-me completamente nas tintas para o tamanho das batatas fritas; há outras coisas cujo tamanho é muito mais importante”.

Pu-la a andar, como imaginam. Não podia fazer outra coisa. E hoje vim para a casa da Praia das Maçãs escrever um livro de instruções para a próxima. Não estou para perder outra vez património por causa de um par de mamas e de batatas fritas.

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