6.12.07

Monólogo do gato e do jantar

Estou com fome. Apetece-me ir jantar. Lembras-te de quando te dizia "vamos jantar-nos?" e tu dizias "sim, vamos. Onde?" "Pouco importa". "Sim, importa". "Não, nada, desde que tu estejas e o jantar seja tão bom como tu és bonita" e tu respondias uma coisa que não posso contar aqui e depois íamos para tua casa, a que tinha os gatos de que eu não gostava. "Não gosto de gatos em casa, nem de cães", "e eu não gosto de barcos" e entre uma casa com gatos ou um barco sem ti eu te escolhia a ti, a eles; um dia chegámos a um acordo: quando os gatos morressem não os substituirias mas infelizmente eu fui-me embora - ou foste tu? - antes de eles morrerem, se calhar eram muito novos e tu já sabias - ou eu? - e nunca mais nos vimos, só tenho uma fotografia de um braço e um gato no meu lugar, não se te vê a cara, e eu que te achava tão bonita, tão bonita.

Lembro-me desses braços, tão longos (e parece tão pequeno na fotografia, não é?, o braço no qual se aninha o gato), e de como eu pensava que um barco sem um braço como o teu não era nada, era um deserto, uma gruta, um buraco e hoje vivo sem ti e de ti só me lembro dos gatos, dos braços e do amor que por ti tinha, apesar dos gatos, e do barco sem ti, e de quanto gostava de nos jantar; "os olhos também comem", diziam-me os olhos de todos os outros clientes do restaurante, e eu pensava "sim, mas com as mãos é melhor, com os cabelos nos olhos, com a boca aberta, os cotovelos em cima da mesa", a mesa era o teu ventre a tua pele o teu desejo os teus braços os teus olhos

e o futuro agora é uma fotografia.





Nota: como tudo neste blog, algumas das fotografias que aqui publico existem, e outras não.

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