30.12.04

Serviço público / CDs

Pietra Montecorvino "Napoli Mediterranea", l'empreinte digitale, ED 13172

Charles Lloyd / Billy Higgins "Which way is East", ECM 1878 / 79, 981 1796

Telefon Tel Aviv "Map of What is Effortless", Hefty Records, Hefty042

Diálogos possíveis

- Olá, viva. Sou fotógrafo amador, e queria fazer uma série de nus. Quer posar para mim?
- Sim, mas só com preservativo.

29.12.04

Primeiro aniversário

Agora sim, cá está - um ano de Don Vivo. Algumas resoluções foram tomadas, nada de fundo, claro - já está suficientemente mau assim: um pouco mais de umbiguismo, um pouco menos de private jokes ou messagens, um pouco mais de fotografias. De resto, steady as she goes.

A quem me tem acompanhado ao longo deste ano, um obrigado sincero.

28.12.04

Miseria, ad nauseam

60,000 mortos (provavelmente mais), a imensa maioria dos quais evitáveis, merecem evidentemente muitos comentários na televisão e nos jornais. Porém, a cobertura televisiva é abominável, repugnante: os jornalistas televisivos tomam-se decididamente por dramaturgos, e maus, qui plus est: devia ser-lhes recomendado não usar mais de um adjectivo em cada duas proposições, evitar o abuso de imagens cujo único objectivo é mostrar o horror, evitar repetir interminávelmente as mesmas imagens, os mesmos comentários indigentes, redundantes, ao nível da revista "Maria". Qual é a missão dos jornalistas da TV? Informar não é com certeza.

Um artigo interessante

Aqui.

27.12.04

Vozes

Steady as she goes era a sua voz de comando favorita (em português diz-se "assim como vai", que é notoriamente menos bonito).

Também gostava muito de "faz fixe!" (em inglês, make fast - mas nesta, inversamente, prefiria a versão portuguesa) e daquela que se lhe seguia, sem falta: "dá volta", ou, para os mais preciosistas, "dá volta à manobra". Era o fim da manobra: o navio estava atracado, e significava que entravam num outro mundo, o da terra, e num outro país (quase sempre).

"Faz fixe": aqui está uma voz que gostaria de dar a muitas outras áreas da sua vida.

Escrever

Escrever é fácil. O que é difícil é não deitar tudo fora.

O Princípio

Foi este o título do primeiro post aqui no Don Vivo, vai fazer quarta-feira um ano. A verdade é que o blog tem mudado, muito, e inúmeros posts mereceriam esse título.

Está pior, mas isso é irrelevante - dado que eu sou a sua única influência exterior, está assim porque eu estou assim também. O ponto de partida era baixo, já, há que reconhecer; é possível que melhore. A ver vamos, daqui a um ano.

Um ano: quantas caras, sonhos, corpos, desencontros?
Quantos ontens fez?


Será o próximo ano um hoje que dure? Acho que sim

Jantar Improvisado - Galinha de Outono

Tudo começou com um refogado, e uma panela daquelas de fundo espesso: cebola, muito alho (hoje é dia de comer alho, não querem lá ver?) - alho que nem descascado fora, repare-se - umas quantas folhas de louro, presunto cortado aos cubos grandes e o respectivo courato, que azeite e manteiga foram em reduzida quantidade, um pimento encarnado, uns bocaditos de aipo (céléri-pomme, agradeço ajuda na tradução).

Em breve as coxas de galinha (foi o que o frigorífico dispensou, na sua grande generosidade) se juntaram ao preparado, já um pouco transpirado, de resto. Acabaram todos a alourar juntos, em alegre fraternização.

Para arrefecer os ardores, duas latas de tomate e uma boa porção dele concentrado, três cubos de caldo de galinha - teria preferido de legumes, mas, qué vaya, não estou numa mercearia - um pouco de vinho branco, água; o lume baixa de intensidade, a tampa da panela cobre-a quase por completo. Não com suficiente rapidez, contudo, para impedir a paprika, os grãos de pimenta preta, a noz moscada, um ramo de rosmaninho fresco e - Allah u Aqbar - um bom punhado de sálvia de ir alegrar o doce cozer de tudo o resto.

E lá cozer cozeu - uma boa hora, ou mais, a lume calmo. No fim, quase mesmo antes do fim, um pequeno ramo de coentros, frescos eles também, forçou o caminho ao encontro dos amigos. Dei-lhes dez minutos, penso, para trocarem impressões e os últimos gossips do frigorífico e dos armários de onde vinham.

Numa panela separada um arroz branco aconteceu; e no wok deram dois ou três pulos o resto do aipo, o resto da beterraba (que, não sendo parte de mais nada, se sentia excluída), o resto do pimento encarnado, já passado pelo forno e pelado, ele.

Acompanhados por um tinto suiço - sim, existe e alguns são tão bons como o sistema político do país. Neste caso, Humagne Rouge 2003, Celliers de Sion, Bibacchus (os rótulos não são muito claros, ao contrário do vinho lui-même, que tem pinta de clarete e é bom, equilibrado como tudo na Suiça, leve, saboroso) os conteúdos dos diferentes recipientes fizeram um jantar delicioso, a repetir, menos improvisado (e provavelmente menos bom).

23.12.04

Um mundo

- Quantos leitores tem o teu blog? - pergunta a mãe.
- Não sei. Já teve trinta, quarenta. Agora tem menos, penso eu - respondo.
- Isso é um mundo - comenta o miúdo.

22.12.04

Descrição - III

"Son regard était planté au-delà de vous, et il parlait toujours de l'avenir, comme si le présent et le passé n'existaient pas."

in
"Histoire d'Une Vie", Aharon Appelfeld, Éditions de l'Olivier, Paris 2004

As duas faces da moeda

- Vamos apostar que você não consegue perder dez quilos num ano - diz o médico.
- Um ano? Doutor, está no saco - responde uma;
- Dez quilos? Isso é impossível - retorque a outra.

Ontologia

Será possível injectar um pouco de outro-eu no eu-eu?

Don´t you always fight

- Não lutes sempre, sê mais como a água, que corre fluida e contorna os obstáculos.
- A água só desce, não sobe.

Diálogo; ou "Resignação"

- Não gosto nada de Genève e ando por lá há vinte anos.
- E eu não gosto da minha vida nem um bocadinho e ando nela há mais tempo ainda.

19.12.04

Descrição - II

Mas não passava de um anjo que, um dia, veio à porta do paraíso ver como era o mundo cá em baixo; debruçou-se demais, ou tropeçou, vá saber-se, e desde aí não pára de cair.

De nuvem em nuvem, cada vez menos nuvem, cada vez mais baixo. O olhar inicial, que era de espanto, transformou-se. O optmismo despreocupado deu lugar a um optimismo desesperado - ela não conhecia outra atitude perante a vida, o pessimismo, ou o realismo.

Uma queda é sempre espantosa, surpreendente. Uma sucessão de quedas não.

História das relações afectivas e amorosas:

Uma sucessão de erros bem intencionados, mentiras que se revelaram verdades, verdades que azedaram, assimetrias irremediáveis, falsas simetrias, encontros que acabaram mal e desencontros que resultaram bem...

Descrição

Tinha o corpo provocante, e a sensualidade bovina, de uma vendedora de centro comercial.

Descoberta

Foi uma descoberta dolorosa, a de que as palavras não são, afinal, todo-poderosas.

15.12.04

Blogosfera

Um interessantíssimo artigo na Foreign Policy. E agora as coisas já não demoram dez anos a passar dos Estados Unidos para a Europa.

Acredito que a influência dos blogs não se vai ficar pela política: o pessoal, social, profissional vão, eles também, mudar devido aos blogs.

Com um obrigado à Alice R. (blog confidencial, secreto, ao que parece).

12.12.04

Dias de chuva e frio...

...só bons para sabores e amores.

11.12.04

Os inimigos do blog

Pensava eu que os inimigos do Don Vivo seriam a lassidão, o excesso de felicidade - ou, pelo contrário, infelicidade a mais - o, mais terrível, facto singelo de nada ter para dizer que mereça ser dito, o trabalho. Agora que o blog se aproxima do primeiro aniversário, verifico que não: o inimigo do Don Vivo é, prosaicamente, a falta de um pequeno caderno para tomar notas e de uma caneta; e a ausência do Paredão, claro.

Mau tempo

Face ao mau tempo, um navio tem duas opções: ou pôr-se "à capa", ou "correr com o tempo".

"À capa" significa aproar ao vento, manter as máquinas (ou o andamento, no caso de uma embarcação de vela) no mínimo indispensável para manter o navio nessa posição, e esperar que passe.

"Correr com o tempo" designa a manobra contrária: pôr o vento na popa (ou na alheta se estivermos a navegar à vela) e manter esse rumo até o mau tempo passar e nos permitir voltar ao caminho.

A capa é incomparavelmnte mais dura, tanto para a tripulação como para o navio, mas tem a vantagem de não nos fazer perder muito caminho; correr com o tempo é mais confortável, mas só é possível se não houver terra a sotavento - nem mesmo o destino: pode ser que seja um porto no qual não se pode entrar com mau tempo, ou uma costa perigosa, por exemplo, e a última coisa que um marinheiro prudente quer é encontrar-se a barlavento de uma costa com mau tempo.

Claro que é possível correr com o tempo na boa direcção - mas é raro, tão raro...

Dúvida

Ele não sabia bem se era a cabeça de um casal que não tinha corpo, ou o corpo de um casal que não tinha cabeça.

8.12.04

Precisão

"Ela é o meu último amor", disse aos amigos. "Em todos os sentidos do termo", acrescentou.

"És o meu último amor. Quão mais valioso que o primeiro..."

5.12.04

Conspirações, estratégias e wishful thinking

Já por várias vezes ouvi a tese que Durão entegou o poder a Santana Lopes para o queimar de vez. Não se poderia fazer a mesma coisa ao Alberto João Jardim? Mais primeiro-sinistro do que Primeiro-Ministro, é certo, mas enfim, dava um prémio a quem arrumasse o homem de vez.

Surpresa (Para S. S.)

Surpresa não é amar-te; é amar, ainda.

2.12.04

Cavaco Silva

Nunca fui grande fã de Cavaco Silva: acho que as reformas dele consistiram mais - se bem que não só - em pintar uma casa em ruínas do que em refazer-lhe as fundações.

Mas hoje partilho absolutamente a posição de Abrupto (que tem uma série recente de posts lapidares), do Blasfémias, e de muitos outros, decerto.

Não é uma questão de homem providencial, é uma questão de homem só. A menos que se lhe juntasse o Vitorino, claro - aí seriam dois homens sós.

1.12.04

Arbres et Lumières

Todos os anos se realiza em Genève o Festival Arbres et Lumières. É um magnífico evento de arte em meio urbano, que tem vindo a melhorar de ano para ano. Não sei se o site vai expôr mais fotografias - a inauguração é hoje, dia 2 de Dezembro - mas é mais uma razão para ir a Genève (além do Chez Marius). Aproveitem o leilão da TAP, se houver vôos, Genève é um bom short break (sobretudo se fôr short).

(Mais) dissimetrias; ou: Mercado

Ao fim de tanto trabalho não remunerado, ele acreditava que a hora chegara de ser recompensado. Infelizmente, essa opinião não era partilhada pelo mercado.

Attendre

Le temps est chien et chiant: il aboye et ne passe pas.

Fatalidade

Fatalidade é aquele palerma ir-se embora, e sermos, provavelmente, gratificados com outro igual.

Trivialia

Porque raio de carga de água é que os portugueses chegam ao Brasil e em três semanas começam a falar brasileiro, e os brasileiros vêm para Portugal e vinte anos depois ainda têm o sotaque da origem? Pior: os portugueses voltam para Portugal e mantêm o sotaque adquirido.

Anteontem o que vi bateu todos os recordes: a dona do restaurante fala no seu sotaque português natal com os clientes, e num impecável brasileiro com a empregada...