29.5.04

Um corpo

Um corpo ama-se por si. Um corpo é uma linha sobre a qual se respira, que nos respira, branca, estreita, ao fundo das mãos.

Um corpo é os cabelos, as mãos, os joelhos, as pernas, o ventre; um corpo és tu em mim. Um corpo. Um corpo mexe-se e ama-nos e fala-nos e acaricia-nos; e nós somos - um corpo, também.

Um corpo é uma noite, uma tarde, uma manhã. Um corpo é um sorriso, é um sopro depois do amor, uma vela que se afasta, uma vela que se acende, uma vela que se apaga. Um corpo é um lago imóvel num jardim, é uma porta que se fecha por dentro, para dentro. Um corpo é uma paisagem branca de neve, um temporal desfeito, uma nuvem bonita que se desfaz, uma vaga na praia, um cometa que passa.

Um corpo é um lugar, uma dádiva, uma esperança. Um corpo é o que os lençóis tapam, e destapam; um corpo é uma forma contra a parede, um arfar suave nas costas, um murmúrio que nos implora mais corpo. Um corpo é um olhar, é seios, coxas, lábios, pele, dedos; um corpo é uma linha estreita no horizonte, na água, no tempo, na noite, na vida.

Um corpo és tu, e é onde eu sou.

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