20.1.04

Imagens do mar

Singapura às seis da manhã: vínhamos de leste, o sol nascia nas nossas costas, e os arranha-céus pareciam torres de chamas contra um céu que hesitava entre o azul escuro e o azul claro.

O primeiro nevão a que assisti na vida, ao largo de Tóquio. Eu e o J. fômos para o convés fazer uma batalha de bolas de neve, que foi também a minha primeira.

Passar o Bósforo, a escassos metros da margem, e acordar com o ladrar de um cão em terra.

Uma cauda de ciclone no Atlântico, o mar branco de espuma - e à noite essa espuma tornava-se fosforescente, uma côr que nem toda a tecnologia do mundo conseguirá reproduzir numa discoteca.

O olhar da prostituta em Cólon, no Panamá, quando eu lhe disse que não queria nada com ela, que ela devia ir tentar ganhar a vida com um cliente mais rentável.

A chegada a Cape Town - todas as chegadas a Cape Town.

A chegada a Nakhodka, na Rússia, uma baía imensa coberta de gelo, a condensação a criar um bruma com um metro de altura, parecia que o gelo estava a arder.

O chefe de máquinas do R.C. em cuecas a tentar fechar o macho de fundo, enquanto a água, a - 2º, entrava a jorros e o navio se afundava, lentamente (encalhámo-lo na praia, mesmo no centro da cidade, para não irmos ao fundo).

A chegada a Fort-de France, com H. que me esperava no cais com uma cerveja para cada um de nós ("uma cerveja, um duche e uma mulher - por esta ordem, se faz favor", diz a tradição).

A tempestade entre Dieppe e Boulogne-sur-Mer, uma noite inteira no meio de uma frota de navios de pesca, a segurar o facho da bóia salva-vidas porque era a única luz que tinha a bordo. Não se via nada, só ouvia o barulho das máquinas deles, mesmo ao meu lado.

A chegada a St. Peter's, em Guernesey, que já contei noutro post.

As baleias à chegada a S. Miguel, nos Açores, e a baleia quando vinha da Horta para Lisboa, que também já contei.

A largada da Horta, à meia-noite, com D. na cama a hesitar se vinha comigo ou não - acabou por vir de avião para Lisboa. Não percebia a urgência; não percebia a liberdade: vou-me embora porque quero ir-me embora, porque posso ir-me embora, apesar de te amar e de seres bela e de ser uma violência para mim também.

O cardume de atuns a caçar entre Sta. Maria e S. Miguel.

As observações (de sextante) com três rectas de altura a cruzarem-se num ponto.

O encontro com H. ao largo das Baleares "no canto sudoeste da nuvem grande que parece uma cabeça de cavalo".

A saída de Nakhodka, provavelmente a saída mais dolorosa que me foi dado viver.


Continua.

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